segunda-feira, janeiro 25, 2010

Cascatas


É engraçado porque é nestes momentos que a pessoa olha em volta. É nestes momentos que se instala o silêncio mental e que parece que não há barulho. O metro passa mas apesar de o vermos, não o ouvimos, como se tudo ficasse subitamente apagado em termos sonoros. As pessoas murmuram algo que não ligamos e sussuram coisas que não compreendemos. E estranhamos. Estranhamos que o mundo todo corre e ninguém se apercebe que uma vida está por um fio, que uma sombra paira em cima de alguém. É estranho que as pessoas sorriam quando eu não tenho vontade de sorrir. É estranho que se espere que todos fiquem triste com a morte de alguém quando na verdade nós costumamos ser exactamente essa pessoa despreocupada, que não tem de chorar pela morte de quem não conhece. É só estranho que o mundo corra, que as coisas aconteçam mas que ninguém saiba, que a vida continue e que o tempo siga em frente, como se ninguém tivesse ficado para trás.

Comentei hoje o quanto tinha gostado de dormir uma longa noite, e o que me disseram foi que era para escapar à realidade. Eu discordo. Eu acompanho a realidade de passo a passo que dou, simplesmente quando fecho os olhos, o meu mundo pára, eu deixo de ouvir e tudo acontece ao mesmo ritmo. Nada passa demasiado rápido, nada continua, nada desenvolve. Tudo pára e eu consigo acompanhar ao mesmo tempo todas as situações que crio, ou que são criadas. Controlo plenamente o tempo, o que se passa à minha volta e os sorrisos e lágrimas que surgem nas expressões de cada um. Talvez seja insensível mas a sua morte não fará tremer. Por muitas lágrimas que deite sinto que me consigo levantar, ela estará bem melhor que todos nós e ficará num lugar que talvez possamos sentir apenas quando nos dão a dádiva da morte. Por enquanto não tenho lágrimas.. Mas os próximos dias podem trazer cascatas.

Sem comentários:

Enviar um comentário